8 de Março: Em ação inédita integrada somente por mulheres, Auditoras resgatam três trabalhadores em Minas Gerais


Por: SINAIT
Edição: SINAIT
06/03/2023



*Com informações da coluna de Leonardo Sakamoto, no UOL


Em ação fiscal inédita, integrada somente por mulheres, oito Auditoras-Fiscais do Trabalho resgataram três trabalhadores submetidos a condições análogas às de escravo, em um sítio de criação de gado em Bom Jardim de Minas (MG). A operação, finalizada no dia 3 de março, foi uma referência ao 8 de Março, Dia Internacional da Mulher.


Mais 15 mulheres participaram do resgate – duas agentes administrativas e uma motorista do Ministério do Trabalho e Emprego, uma procuradora do Ministério Público do Trabalho, uma defensora pública da Defensoria Pública da União, uma delegada e nove agentes da Polícia Federal.


“Sempre contamos com mulheres coordenando as equipes, mas dessa vez todas as servidoras de todas as instituições eram mulheres. Esperemos que seja a primeira de muitas ações semelhantes”, afirma a Auditora-Fiscal do trabalho Andréia Donin, que coordenou a ação.


Para a Auditora-Fiscal do Trabalho Gislene Stacholski, que também participou da ação, ainda é necessário que eventos como esse ocorram a fim de conscientizar sobre a igualdade. “E, principalmente, para empoderar o trabalho de milhões de mulheres que não têm voz nas suas profissões e se sentem inferiorizadas e oprimidas em seu ambiente de trabalho”, diz.


Não é exagero dizer que o sistema público de fiscalização de denúncias de trabalho escravo foi implementado majoritariamente por mulheres a partir de maio de 1995, quando o Brasil reconheceu diante das Nações Unidas a persistência da escravidão.


Baseado em grupos especiais de fiscalização móvel, o sistema foi estruturado pela Auditora-Fiscal do Trabalho Ruth Vilela, que coordenou a Secretaria de Inspeção do Trabalho. E, nos primeiros anos, Auditoras como Claudia Marcia Brito, Marinalva Dantas, Valderez Rodrigues e Virna Damasceno chefiaram esses grupos em um momento em que eram comuns ações que se deparavam com violência, ameaças de morte, cadáveres de trabalhadores que tentavam fugir. Juntas, libertaram milhares de pessoas.


De acordo com o ministério, a operação, realizada na semana passada, homenageia as tantas servidoras que se dedicam diariamente à promoção de dignidade aos trabalhadores e às trabalhadoras deste país e reforça o importante papel do trabalho da mulher no contexto social.


Resgate em Minas


Na ação em Bom Jardim de Minas, dois dos resgatados eram irmãos e trabalhavam no sítio Serra Verde desde 2015. O terceiro tinha 74 anos e estava havia 15 anos.


“Impressionou a condição de miserabilidade a que estavam expostos. Eles não tinham dinheiro para comprar itens mais básicos de higiene e alimentação. Quando chegamos na hora do almoço, tinham apenas arroz e feijão para comer. Segundo eles, se quisessem um ovo, tinham que comprar por R$ 1 cada da proprietária”, afirmou Andréia Donin.


Os dois irmãos tinham comprado um lote de 200 metros quadrados da dona do sítio, onde construíram pequenas casas, de acordo com a fiscalização. Mas como não tinham nenhum título para comprovar a propriedade, temiam perder o terreno, um investimento de uma vida inteira, se fossem trabalhar em outro local.


“Então, desde 2015, estão vinculados a essa terra, aceitando trabalhar pelo que era oferecido porque não podiam sair dali”, afirma Donin.


A situação do trabalhador de 74 anos era um pouco diferente. “A casa onde morava estava em péssimas condições de conservação e higiene. Havia alguns poucos móveis velhos, uma cama com colchão sujo e rasgado, tudo ficava jogado. Os animais entravam e saíam do local. O banheiro não funcionava, não tinha água. E ainda guardava veneno para matar carrapatos das vacas dentro do seu quarto”, explica a Auditora Gislene Stacholski. “Ele recebia R$ 100 por semana.”


O total de direitos trabalhistas e verbas rescisórias dos três ficou em R$ 177,5 mil. Mas, segundo a fiscalização, a proprietária do sítio Serra Verde, Paula Marendaz, por meio de seus representantes, não reconheceu o valor e não pagou os trabalhadores.


Ela fechou um termo de ajustamento de conduta com o Ministério Público do Trabalho e com a Defensoria Pública da União, ao qual a coluna teve acesso, comprometendo-se a pagar um dano moral de R$ 5 mil para cada um, em dez parcelas, e firmando compromisso de seguir a legislação.


Brasil resgatou mais de 2,3 mil escravizadas entre 2003 e março de 2022


O Estado brasileiro resgatou da escravidão contemporânea pelo menos 2.325 mulheres de 2003 a março de 2022, de acordo com dados da Divisão de Fiscalização para a Erradicação do Trabalho Escravo do Ministério do Trabalho e Emprego. O número representa quase 6% do total de flagrados nessas condições no período.


De acordo com os dados, 61% declararam ser negras – taxa maior que os 56% de negros na sociedade brasileira estimados pelo IBGE. Ao todo, 36% nasceram na região Nordeste e 53% tinham entre 18 e 39 anos. Vale ressaltar que 3% das resgatadas tinham entre 15 e 17 anos, e 0,6% entre dez e 14 anos. Do total, 56% eram iletradas ou tinham menos que cinco anos de estudo.


A agropecuária foi a atividade principal das resgatadas, seguida pelo trabalho na cozinha e costureira em confecções. Em 2021, o serviço doméstico envolveu 27 vítimas – no ano anterior, haviam sido apenas três. De acordo com o estudo “Trabalho escravo e gênero: quem são as trabalhadoras escravizadas no Brasil?”, produzido pela Repórter Brasil, com o apoio da Organização Internacional do Trabalho (OIT), essa condição de minoria contribuiu para que elas permanecessem invisíveis.

Categorias


Versão para impressão




Assine nossa lista de transmissão para receber notícias de interesse da categoria.