O SINAIT divulga matéria de O Globo que trata do relatório feito pelo Departamento do Trabalho dos Estados Unidos - EUA, em que afirma que 11 setores da economia brasileira, a exemplo da pecuária e de calçados, usam trabalho infantil como mão-de-obra. A lista, que traz 122 produtos de 58 países, foi elaborada com o objetivo de conscientizar os consumidores norte-americanos sobre a origem do que está sendo comprado.
Em número de ocorrências, o Brasil ficou empatado em terceiro lugar com Bangladesh, depois de Índia, com 19 setores, e Mianmar, com 14.
Por outro lado, segundo a matéria, o Brasil é apontado pelo mesmo relatório como um dos países mais “transparentes”, que admitem o problema e permitem a publicação de dados.
O governo brasileiro mostrou-se insatisfeito em relação à publicação. Para o Ministério das Relações Exteriores, faltam transparência e confiabilidade ao documento, que pode servir de pretexto para medidas protecionistas contra os países citados.
A utilização de mão-de-obra infantil no campo e na cidade é constatada com freqüência pelos Auditores Fiscais do Trabalho – AFTs. Na área rural a maioria dos casos acontece em fazendas e carvoarias. Na cidade, crianças e adolescentes são constantemente encontradas trabalhando como domésticas, babás, entre outras.
A preocupação da categoria com o grande número de crianças, até 14 anos, que trabalham - e não deveriam porque a lei proíbe – é grande. Para os AFTs, a pouca instrução das famílias é um dos agravantes que dificulta o combate a esse tipo de crime. Parece ser óbvio, mas segundo a presidente do SINAIT, Rosa Jorge, vale lembrar que “enquanto governo e sociedade não se conscientizarem que ao invés de estar trabalhando essas crianças deveriam estar na escola e também brincando, a fiscalização trabalhista não dá conta desse problema social”.
Mesmo com um número reduzido, o trabalho de fiscalização dos AFTs tem contribuído com perspectivas de dias melhores. Nos últimos dois anos, o trabalho de conscientização, feito por eles junto a empresários - sobre a importância de empregar menores aprendizes - foi responsável pela inserção de mais de 66 mil jovens aprendizes no mercado de trabalho.
Os AFTs entendem que têm um trabalho importante a fazer no combate a essa chaga social, mas que precisam de mais apoio para fazê-lo. Apoio humano, estrutural, de parcerias, políticas públicas mais dirigidas a essa questão específica, entre outros.
Mais detalhes na matéria do Jornal O Globo:
11-09-2009 O Globo
Vergonha no trabalho
Americanos listam 11 setores com crianças trabalhando no Brasil. Governo teme viés comercial
Gustavo Paul e Cássia Almeida
No Brasil, há trabalho infantil e/ou forçado em 13 setores da economia, como criação de gado, cana-de-açúcar e algodão, afirmou relatório divulgado ontem pelo Departamento do Trabalho dos Estados Unidos. Há crianças brasileiras trabalhando em 11 diferentes atividades econômicas. O documento lista 122 produtos, oriundos de 58 países, em situação de trabalho infantil ou análogo à escravidão, com o objetivo de “conscientizar consumidores e empresas americanos” para não comprarem esses itens.
Em número de ocorrências, o Brasil está empatado em terceiro lugar com Bangladesh, depois de Índia, com 19, e Mianmar, com 14.
O relatório ressalta que o número de ocorrências não significa que esses países estejam em pior situação, e sim que admitem o problema e permitem a divulgação desses dados. São citados como países mais transparentes Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Filipinas, Índia, México, Quênia, Tanzânia, Turquia e Uganda.
O Brasil recebeu elogios por seu combate ao problema, o que também foi ressaltado pelo cientista político Leonardo Sakamoto, da Comissão Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo. Ele lembrou a transparência no governo sobre o trabalho forçado no Brasil — de 1995 a 2009, 35 mil pessoas foram libertadas no país.
— No Brasil, há muito mais casos reportados do que pela ditadura chinesa, por exemplo. Aqui a imprensa é livre, e essas questões são mais visíveis. E temos uma economia mais diversificada, com mais atividades — disse Sakamoto, que criticou o fato de os EUA não estarem no relatório. — Há trabalho escravo no mundo inteiro.
O relatório, porém, admite haver trabalho infantil e forçado nos EUA, lembrando que cinco fazendas de mirtilo foram processadas este ano por uso de crianças na lavoura.
Mas o governo brasileiro mostrou indignação. Para o Ministério das Relações Exteriores, faltam transparência e confiabilidade ao documento, que pode servir de pretexto para medidas protecionistas contra os países citados. “O Brasil não reconhece a legitimidade de relatórios sobre direitos humanos produzidos unilateralmente por terceiros países, cujas fontes e critérios de elaboração não possuem transparência (...). O Brasil tampouco concorda com a vinculação entre padrões trabalhistas e questões comerciais, dada a possibilidade de que tal procedimento seja usado com fins protecionistas ”, afirmou o Itamaraty em nota.
O Ministério das Relações Exteriores disse ainda que, ao contrário dos EUA, o Brasil ratificou as convenções internacionais sobre o combate ao trabalho forçado e infantil.
Empresários brasileiros ouvidos pelo GLOBO vão na mesma linha: a lista seria uma forma de criar barreiras aos produtos nacionais e uma resposta às decisões do país de impor sanções aos americanos. O Brasil foi autorizado, pela Organização Mundial do Comércio (OMC), a retaliar os EUA em cerca de US$ 800 milhões, devido a subsídios ilegais aos produtores de algodão.
Empresários falam em ‘golpe baixo
Para o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), Haroldo Rodrigues da Cunha, isso já era esperado: — São barreiras não tarifárias e um golpe baixo dos americanos. Isso é conversa fiada — disse Cunha.
A Associação Brasileira de Calçados (Abicalçados) teve a mesma reação. O vice-presidente da entidade, Elcio Jacometti, presidente do Instituto PróCriança, desafiou os americanos a apresentarem provas. Ele afirmou que a produção brasileira de calçados é auditada pela embaixada americana e referendada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).
A União da Indústria da Cana de Açúcar (Unica) admitiu que podem ocorrer casos eventuais de trabalho infantil no setor, mas reclamou da generalização.
O professor do Instituto de Economia da UFRJ José Roberto Novaes ressaltou que, devido à inovação tecnológica e às mudanças na organização do trabalho, que levam a jornadas muito exaustivas, as crianças deixaram a lavoura de cana-de-açúcar, mas ainda há muita exploração. E acrescentou que políticas como o Bolsa Família tendem a reduzir o problema.
No Brasil, em 2007, segundo o IBGE, havia 4,8 milhões de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos trabalhando. Em 2006, eram 5,1 milhões.