Inspeção do Trabalho tem desafios em todo o mundo


Por: SINAIT
Edição: SINAIT
30/09/2009



Rosa Jorge, Carlos Rimachi, Sylvio Barone, Hugo Carvalho, Guillermo Pusineri e Sergio Voltolini. Foto: João Peres


 


27º ENAFIT


 


A 1ª Jornada Iberoamericana de Inspeção do Trabalho, dentro da programação do 27º ENAFIT, aconteceu na tarde desta terça-feira, 29 de setembro, com dois painéis. O primeiro – Diagnóstico da Inspeção do Trabalho na América do Sul e Península Ibérica – contou com a participação de representantes da Inspeção do Trabalho no Peru - Carlos Rimachi Farfán, Paraguai - Guillhermo Pusineri e Uruguai - Sergio Voltolini, além da presidente do SINAIT, Rosa Jorge, que falou sobre a situação no Brasil.  Maria Del Henar, da Espanha, não pode comparecer, mas enviou um trabalho que foi apresentado por Sergio Voltolini.


 


A situação apresentada pelos Inspetores do Trabalho é bastante preocupante, como eles próprios definiram. A Inspeção do Trabalho é frágil, especialmente no Paraguai, onde os salários estão congelados há anos e corresponde a 300 dólares. Lá, os Inspetores do Trabalho podem exercer outras funções, o que garante a sobrevivência. Gullhermo Pusineri, por exemplo, é tabelião e somente continua exercendo a profissão porque gosta do trabalho e acredita nele. O número de inspetores é muito pequeno e nem todos são concursados: há 60 na capital Assunção, sendo 20 contratados, e cinco nas Províncias de Ciudad Del Este, Encarnacion e Cordillera. As condições de trabalho são precárias, não há veículos nem diárias para viagens e fiscalizações em outras províncias, a jornada de trabalho é de oito horas e, pior, os inspetores sofrem perseguição política.


 


No Peru, disse Carlos Rimachi Farfán, que é diretor de Organização do Sindicato de Inspetores de Trabalho do Peru, a Inspeção do Trabalho é muito concentrada em Lima/Callao e há somente uma regional que cuida das demais regiões. São 18 supervisores e 193 inspetores em Lima e outros 101 se dividem para fiscalizar as 25 regiões do país na Delegacia de Âmbito Nacional. Grande parte deste contingente foi contratada em 2008 e hoje todos estão formalizados, o que é considerado um avanço.


 


Farfán considera que o número de inspeções é baixo, especialmente no interior. A fiscalização é mais frequente sobre os problemas trabalhistas e na indústria manufatureira, mas também há ações de combate ao trabalho infantil e na área de segurança. É realizado trabalho de orientação às empresas e em 2008, em Lima, cerca de 12 mil infrações trabalhistas foram concluídas.


 


Os principais problemas são de infraestrutura de logística, falta de planejamento anual, descentralização da fiscalização e a concentração dos esforços em Lima e a política equivocada no setor do trabalho.


 


No Uruguai a Inspeção do Trabalho foi criada em 1907 e o Ministério do Trabalho em 1967. A autoridade máxima da Inspeção do Trabalho é o Inspetor Geral do Trabalho, que é cargo de confiança e não há exigência de que seja Inspetor do Trabalho para exercê-lo. Há 4 divisões na Inspeção: Documentos de Controle (emite documentos que equivalem à Carteira de Trabalho no Brasil), Jurídica (analisa as multas), Condições Gerais de Trabalho e Condições Ambientais de Trabalho.


 


O número de Inspetores é baixo e concentrado em Montevideo. Ao todo, são 130 inspetores, sendo 30 deles contratados em 2008, por prazo determinado. 70 atuam na área de Condições Gerais de Trabalho e 60 em Condições Ambientais de Trabalho. Somente 16 atuam no interior do país e algumas províncias não têm inspetores. Para o Inspetor do Trabalho Sergio Voltolino – Secretário Geral da Associação dos Inspetores do Trabalho do Uruguai (Aitu) – a distribuição não é adequada e esse acúmulo faz com que os inspetores que ficam na capital viajem muito para atender demandas de outras províncias. A Inspeção do Trabalho no Uruguai atua nas áreas pública e privada. Em termos de documentação fica restrita ao setor privado, mas na área de saúde e segurança atua também no setor público.


 


Voltolini entende que depois de muitos anos de políticas de flexibilização das leis e de fragilização da fiscalização, atualmente há um movimento de revalorização da categoria. Exemplo disso foi a retomada da atividade como exclusiva de Estado em 2007 e incompatibilidade com o exercício de outras profissões, exceto professor, mediante autorização do Inspetor Geral. A jornada é de oito horas, normalmente de segunda a sexta-feira, com registro em cartão de ponto. Para que houvesse mudanças concorreram as freqüentes denúncias feitas pela Confederação Iberoamericana de Inspetores do Trabalho – CIIT.  Entretanto, a relação com o governo está sendo difícil. Vários pontos de acordos não têm sido respeitados, como a tabela salarial negociada e a liberdade sindical.


 


Sergio Voltolini considera que problemas de infraestrutura, falta de recursos, inspetores trabalhando por contrato, falta de veículos e planejamento são crônicos, de difícil solução. Do lado oposto, os avanços foram a ratificação das Convenções nº 155 e 184 da OIT, o estabelecimento da negociação coletiva e a jornada de trabalho de oito horas para trabalhadores rurais e domésticos.


 


A Associação, com quase 25 anos de existência, faz sua parte capacitando os inspetores e outros servidores públicos, atividade que é questionada pelo Estado.


 


Espanha


Sergio Voltolino apresentou também  o diagnóstico da Inspeção do Trabalho na Espanha, no trabalho enviado por Maria Del Henar. A Inspeção do Trabalho naquele país data de 1906, mas o Ministério do Trabalho foi criado somente em 1920. Até 1939 as mulheres não podiam ocupar cargos de Inspetoras do Trabalho. Desde 1984 a instituição denomina-se Inspeção do Trabalho e Seguridade Social, composto por Inspetores e Subinspetores do Trabalho. Uma nova reforma da lei está em estudo, para criar o corpo de Subinspetores de Prevenção de Riscos do Trabalho, em nível técnico. O acesso ao cargo se dá por concurso desde 1960 e os aprovados passam por curso de formação de 400 horas. Até dezembro de 2008 havia 836 Inspetores do Trabalho e 910 Subinspetores. Em 2009, foram chamados mais 163 Inspetores e 55 Subinspetores.


 


Os Inspetores do Trabalho têm atribuições para fiscalizar as normas trabalhistas, fazer prevenção de riscos trabalhistas, colocação, emprego e proteção em caso de desemprego, fiscalizar cooperativas e o trabalho de estrangeiros, além da seguridade e proteção social. São ligados a uma autoridade central dentro do Ministério do Trabalho e Imigração. Em cada província existe uma unidade com autonomia para organizar a Inspeção do Trabalho. Os Inspetores não têm horário fixo, mas podem ser localizados a qualquer hora para investigar acidentes. Os deslocamentos são feitos em veículos próprios, com ressarcimento posterior das despesas. A remuneração tem uma parte fixa e outra variável, que obedece critérios de produtividade mínima e máxima. Os Inspetores do Trabalho são considerados autoridades públicas, sendo os Subinspetores agentes da autoridade pública. Todos os órgãos do governo estão obrigados a colaborar com a Inspeção do Trabalho na Espanha, segundo informações de Maria Del Henar. É grande a gama de atividades dos Inspetores e Subinspetores do Trabalho, compreendendo toda a fiscalização da lei trabalhista, normas de segurança e saúde (com embargos de obras, paralisação de atividades), trabalho de estrangeiros e imigração.


 


Melhor estrutura


Diante da exposição da situação nos países da América do Sul, Rosa Jorge, presidente do SINAIT, fez a observação de que a Inspeção do Trabalho no Brasil está em melhor situação, com a ressalva de que é preciso avançar muito ainda para chegar a condições ideais. Para ela, está claro que os países, incluindo o Brasil, ratificaram a Convenção 81 da OIT, mas a cumprem integralmente.


 


Um problema comum a todos os países é o baixo número de inspetores. No Brasil, em que cada região tem características próprias, há 2.996 Auditores Fiscais do Trabalho – AFTs, para demandas muito complexas e diversas na área urbana e no campo, como o combate ao trabalho infantil e escravo, combate à informalidade exigindo que a Carteira de Trabalho seja assinada, verificação do recolhimento do FGTS, prevenção de acidentes e doenças nos ambientes de trabalho. Segundo estudos da OIT seria necessário pelo menos o dobro do número de AFTs em atividade para atender à proporção de 1 AFT para cada 20 mil trabalhadores da População Economicamente Ativa – PEA. A situação atual é de que em todos os estados faltam AFTs, mas alguns sofrem mais, como o Amazonas, em que o território é grande e os deslocamentos muitos difíceis. A realização de poucos e complicados concursos não tem suprido a necessidade de reposição do quadro e a partir de janeiro de 2010 a previsão é de que haja um grande número de aposentadorias, agravando ainda mais a situação. Além de preencher as vagas existentes, o desafio é criar novas vagas, o que só pode ser feito por projeto do Executivo. Mesmo com essa deficiência quantitativa mais de 150 mil empresas foram fiscalizadas em 2008 alcançando cerca de 30 milhões de trabalhadores.


 


No Brasil, disse Rosa, o O AFT se afirma como autoridade fiscal – lavra o auto e lança o débito e só eles têm a competência para fazer isso. Apesar do trabalho árduo de combate ao trabalho escravo e infantil, há cerca de 40 mil escravizados e cerca de 3 milhões de crianças trabalhando. Os AFTs agem para prevenir acidentes, mas eles aumentam e não há estatísticas confiáveis. Hoje o modelo é generalista, todos os AFTS têm as mesmas competências, mas a prática tem demonstrado que isso não está dando certo, pois o número de acidentes e doenças aumentou e para isso contribuiu o desaparelhamento da área de segurança e saúde. É um problema para enfrentar. O sucateamento, porém, não é somente nesta área; atinge de forma gera toda a Fiscalização do Trabalho.


Em termos de carreira os AFTs brasileiros estão em melhor situação que os colegas dos países vizinhos. A remuneração é paga em parcela única desde julho de 2008 com a implantação do subsídio, modalidade praticada apenas para as carreiras exclusivas de Estado,  mas continuam existindo metas, o que seria normal se elas não estivessem fora da realidade.  “Adequar o modelo é um desafio a ser enfrentado”, disse a presidente do SINAIT.


 


Rosa Jorge acredita que o diagnóstico apresentado no painel é um espelho do que acontece no mundo. Em recente participação em seminário da OIT sobre a Inspeção do Trabalho e a crise econômica mundial, com mais de 50 países, muitos eram representantes de empresas particulares e seguradoras, demonstrando que em diversos países a inspeção não é exclusiva de Estado. A fiscalização sofre mesmo em países desenvolvidos como a Alemanha e França. “O Brasil foi citado muitas vezes como exemplo e modelo de fiscalização, mesmo com todos os problemas que enfrentamos”, disse a presidente.


 


A pergunta agora é o que fazer para recuperar o que foi perdido. Um dos caminhos é agir em conjunto, não centrando forças apenas no problema individual de cada país, mas de forma geral, para fortalecer a Inspeção do Trabalho no mundo, porque disso depende a garantia dos direitos dos trabalhadores em qualquer lugar do mundo.


 


Debate


Nos debates os inspetores esclareceram situações particulares de cada país. No Uruguai a fiscalização é realizada nos setores público e privado, especialmente na área de prevenção de acidentes e doenças laborais. Os AFTs têm status de autoridade policial e sentem-se seguros para desenvolver as atividades de inspeção. Quando há insegurança eles solicitam acompanhamento policial. Igualmente, no Paraguai e no Peru não há ameaças graves aos inspetores, mas existem pressões, algumas vezes por parte das próprias autoridades do governo.


 


O papel da Confederação Iberoamericana de Inspetores do Trabalho – CIIT foi destacado pelos inspetores como uma instituição que denuncia o descumprimento da Convenção 81. Para os Inspetores do Paraguai, Peru e Uruguai é uma utopia alcançar as condições de trabalho que os AFTs brasileiros têm, mas lutam para melhorar o máximo possível. No Paraguai, em particular, onde os salários estão congelados há muitos anos, há desmobilização dos inspetores por falta de estímulo. Muitos já se desligaram totalmente da atividade em razão do baixo salário e da perseguição política.


 


Sergio Voltolino afirmou que os Inspetores do Uruguai já têm conhecimento da situação dos trabalhadores da Região Sul do Brasil que estão sendo arregimentados de forma clandestina para o corte de madeira na fronteira. Eles estão sendo submetidos a condições análogas à de escravos e a forma de abordar esse problema está sendo estudada. De maneira geral, o combate ao trabalho infantil e escravo nos outros países é insipiente.


 


A presidente do SINAIT esclareceu que a entidade tem agido para repelir ou amenizar dispositivos de projetos que são nocivos aos trabalhadores, individualmente ou em parceria com outras entidades. Afirmou que existe vigilância constante e que as dificuldades são muitas porque o movimento sindical está enfraquecido, muito em razão da terceirização que minou as representações das categorias. Acredita que, depois das conquistas salariais, o próximo desafio é a reposição e ampliação do quadro de AFTs.

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