Denúncia é subsidiada pelo relatório dos Auditores-Fiscais do Trabalho que aponta a prática de jornadas de 11 a 16h por dia, fraude no sistema de ponto, assédio moral e ausência de descanso semanal, férias, 13º e FGTS
Com informações do MPF
Nesta sexta-feira, 14 de maio, o Ministério Público Federal (MPF) propôs ação penal contra sete pessoas responsáveis por reduzir 13 brasileiros à condição análoga a de escravo enquanto trabalhavam a bordo do navio de cruzeiro MSC Magnifica, na temporada 2013/2014. O crime está previsto no artigo 149 do Código Penal e pode sujeitar os responsáveis à reclusão, de dois a 8 anos, e multa, além da pena correspondente à violência.
A ação do MPF é subsidiada pelo relatório dos Auditores-Fiscais do Trabalho que durante as fiscalizações constataram que os 13 trabalhadores, contratados por intermédio de empresas brasileiras que arregimentavam mão de obra para a MSC Crociere S.A., laboravam no MSC Magnifica em condições análogas a de escravos. Eles exerciam jornadas de 11 a 16 horas diárias, sem descanso semanal de 24 horas, com períodos de intervalos fragmentados ao longo da jornada e frequentemente interrompidos por atividades de trabalho paralelas, reuniões de trabalho, sistema de prontidão, além de treinamentos de segurança. Também não tinham direito a férias, décimo terceiro salário, FGTS, dentre outros direitos previstos na Constituição Federal e na legislação trabalhista brasileira.
Os tripulantes que exerciam funções de camareiros, assistente de camareiros, atendente de bar, atendente de buffet, garçom e assistente de garçom – relataram, ainda, que eram submetidos a forte pressão psicológica por parte das pessoas denunciadas pelo MPF: oficiais e chefes da embarcação que os assediavam moralmente por não se sujeitarem aos seus abusos. Mencionaram, inclusive, o uso de expressões preconceituosas, seguido de ameaças fundadas na perspectiva de que a situação deles poderia piorar quando o navio saísse do alcance das autoridades brasileiras.
Segundo as investigações, antes da assinatura de contrato com a MSC, havia um comprometimento financeiro inicial por parte dos trabalhadores, decorrente do pagamento de cursos de formação, exames médicos e passagens aéreas para atuar nos postos de trabalho. Tal endividamento deixava essas pessoas vulneráveis e suscetíveis às pressões e exigências por parte dos prepostos da empregadora, dado o receio de serem despedidas sem sequer receber o suficiente para cobrir os gastos realizados para ingressar no quadro de funcionários da MSC.
O Relatório dos Auditores-Fiscais do Trabalho apontou as seguintes constatações:
- A jornada era de, no mínimo, 11 horas diárias, fragmentada em vários períodos, de acordo com a conveniência do empregador, podendo chegar a 16 horas diárias.
- O trabalho era realizado em todos os turnos (manhã, tarde e noite) e as escalas de trabalho eram modificadas constantemente, conforme a conveniência do empregador, para o funcionamento dos bares, restaurante e buffet.
- O trabalho desenvolvido era de alta intensidade, dada a natureza dos serviços prestados (transporte de malas e carrinhos de refeições; limpeza dos ambientes etc.).
- Os trabalhadores não tiveram descanso semanal ou qualquer folga de 24 horas consecutivas ao longo dos meses de duração do contrato, havendo registro de pessoas que laboraram por nove meses nessa situação.
- O assédio moral praticado contra os trabalhadores tinha reflexos no sistema de jornada e descanso, na medida em que as punições e advertências geravam repentinas trocas de horário de trabalho e cancelamento de pausas para descansos durante a jornada.
- Houve fraude nos registros de ponto, evidenciando que a empresa manipulava e alterava – por meio de sistema e manualmente – os registros de jornada dos empregados computando, no máximo, 11 horas diárias.
- Durante inspeção realizada no navio, cinco dos 13 empregados foram flagrados trabalhando enquanto a escala exibida no escritório do respectivo supervisor indicava que estariam em horário de descanso. De acordo com os depoimentos dos trabalhadores, a exaustão ocasionada pela natureza do trabalho desempenhado obrigava as próprias camareiras a contratarem colegas para ajudarem em suas tarefas, mediante pagamento.
O ponto de partida da investigação foi a inspeção realizada em março e abril de 2014, por uma força-tarefa que avaliou as condições de trabalho a bordo do navio de cruzeiro MSC Magnifica, que atracou nos portos de Santos (SP) e Salvador (BA). (Relembre aqui).
Além dos Auditores-Fiscais do Trabalho, a equipe contou com integrantes do MPF, do Ministério Público do Trabalho (MPT), da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), da Marinha do Brasil, da Advocacia-Geral da União, da Defensoria Pública da União e da Polícia Federal.
Mais informações sobre a denúncia do MPF aqui.
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