Chacina de Unaí - Viúvas dos Auditores-Fiscais mortos pedem justiça e paz


Por: SINAIT
Edição: SINAIT
25/05/2022



Vinte testemunhas serão interrogadas, 14 de acusação e seis de defesa. Viúvas se emocionam com os relatos


Por Andrea Bochi e Solange Nunes


Nesta quarta-feira, 25 de maio, após o intervalo para o almoço, foram ouvidas duas viúvas dos Auditores-Fiscais do Trabalho mortos. Ao todo serão interrogadas 20 testemunhas, sendo 14 de acusação e seis de defesa.


O julgamento de Antério Mânica, acusado de ser um dos mandantes da Chacina de Unaí, está sendo realizado na sede da Justiça Federal em Belo Horizonte, desde a manhã de terça-feira, 24 de maio, e a previsão é de que dure até sexta-feira, 27 de maio.


O crime ocorreu em janeiro de 2004, quando três fiscais do trabalho, que investigavam denúncias de trabalho escravo na região, e o motorista que os acompanhava foram assassinados em uma emboscada.


Testemunhou, como colaboradora de acusação, Helba Soares, viúva do Auditor-Fiscal do Trabalho Nelson da Silva, que foi ouvida na condição de parte do processo. Ao falar sobre Nelson, disse que o auditor não tinha inimigos e se relacionava bem com ambas as famílias. Morava em Unaí desde 2001 e esteve lotado em Paracatu durante cinco anos.


“Se não me matarem até lá” eram as palavras que Nelson repetia em diversas ocasiões, quando faziam planos para o futuro, segundo Helba. Acrescentou ainda que o companheiro havia comentado com ela sobre ameaças que havia sofrido.


Helba relembrou várias situações que indicam a participação de Antério no crime, apesar dos 18 anos que se passaram. “Foi marcante, por ter acontecido em uma cidade pequena, do interior”, disse.


A viúva contou ainda que, no dia do crime, a empregada de Antério comentou que ele estava nervoso e que após um telefonema, se tranquilizou e disse “foi feito o serviço, então”. Mas, Helba disse que ao procurá-la, a empregada pediu para que não contassem para ninguém porque temia por sua vida. “Se eles fizeram isso com os Auditores-Fiscais, o que farão comigo? Teria dito a empregada doméstica”


Sobre o Marea, a depoente disse que soube que o automóvel permaneceu durante muito tempo coberto na garagem da casa de Antério Mânica.


Helba falou sobre frases que, segundo ela, foram ditas pelos Mânica e que chegaram ao seu conhecimento: “Bala que entra em cabeça de fiscal, entra também em cabeça de candidato”, “Não matamos quatro pessoas, mas quatro cachorros”.


A viúva de Nelson relatou que trabalhou em empresas ligadas a Antério e que já o viu muito alterado e violento. “Quando ficava bravo, as pessoas que trabalhavam com ele, contam que era incontrolável”, contou a viúva.


O depoimento de Helba foi o mais longo desta quarta-feira e durou mais de uma hora.


Na sequência, a viúva do Auditor-Fiscal do Trabalho, Eratóstenes de Almeida, Marinez Lina de Laia, se emocionou ao falar do esposo. Marinez depõe como colaboradora, já que é parte no processo. “Esses 18 anos ficaram como uma lacuna na minha vida. Minha filha tinha seis anos na época. Somos até hoje as viúvas da Chacina de Unaí e vamos para o túmulo com esse título”, lamentou.


Marinez relatou sobre o trabalho do esposo. Disse que tem rascunho feito por Eratóstenes sobre fiscalização em fazendas de Antério Mânica e que haviam chamado ele e outros colegas Auditores-Fiscais de “meninotes”, durante fiscalização.


Para a procuradora Mirian Lima, Marinês disse que jurou no caixão de Eratóstenes que lutaria até o fim e que não esqueceria daquela tragédia e de todo o sofrimento. “Roubaram ele de mim. É um vazio e uma injustiça tão grandes que não consigo descrever. Foi um crime brutal e uma violência tão pesada que deixou uma marca que jamais será esquecida. Foi trabalhar e voltou daquela forma, em um caixão. Quero justiça feita! Espero que essa sentença venha para marcar e que seja feita justiça!”, pediu.


O marido de Marinez, o Auditor-Fiscal do Trabalho, Eratóstenes de Almeida Gonsalves, foi executado com vários tiros, juntamente com os também auditores, Nélson José da Silva e João Batista Soares Lage, e o motorista Aílton Pereira. No dia do crime, eles realizavam fiscalizações de rotina na área rural do município de Unaí, em Minas Gerais.


Início de depoimentos das testemunhas de defesa


Antônio Celso dos Santos, um dos responsáveis pelas investigações do caso, é delegado de polícia federal aposentado. Ele integrou o julgamento, como primeira testemunha de defesa, por parte de Antério Mânica. Descreveu vários pontos da investigação, entre as ações como policial federal e que a primeira providência que tomou ao chegar em Unaí, foi reunir as equipes e dividir as atribuições. “Após as circunstâncias, definiu-se que as mortes foram causadas em razão das funções”. Em 2015, Celso depôs como testemunha de acusação.


O depoimento do policial federal diferiu em vários momentos de seu relato feito durante o primeiro julgamento de Antério Mânica, em 2015, quando depôs como testemunha de acusação. Inclusive, a procuradora Mirian Lima levantou a questão e possibilidade de ter ocorrido sonegação de informações sobre as investigações, com base em seu relato. Celso negou e disse que o processo e as investigações foram muito longas o que dificultou a inclusão de todas as informações no processo.


Declarou ainda que, ao observar o local em que encontraram a caminhonete, verificaram que não tinham sido ali os assassinatos. Descobriram o verdadeiro local, somente dois dias depois. Foram ouvidas 80 pessoas. A equipe fez o trajeto da casa do Nelson até o local do crime. “Os primeiros telefones checados foram os de fora de Unaí. Imaginamos que se fosse um caso de encomenda dos assassinatos, não seria da cidade”. 


Neste mesmo tempo, declarou que as outras diligências estavam sendo feitas. “Depois disso, estávamos seguindo outras linhas, tentando pegar os executores, que provavelmente entregariam os intermediários e os autores”.


Disse que, com as informações iniciais, “pedimos perícia e sabíamos que deveria haver dois carros no local do atentado”. Ele comentou que, o Erinaldo de Vasconcelos atirou tanto na cabeça do motorista, quanto no Auditor-Fiscal. “Com estas informações, começamos a cruzar os dados, e somente esta fase durou um mês”.


Declarou ainda que, depois de um tempo “minha equipe e mais duas equipes foram as que permaneceram na investigação”. Neste momento, “decidimos refazer as investigações e apuramos os hotéis e os postos de gasolina para verificar se as pessoas eram de fora de Unaí”, disse Antônio Celso dos Santos.


Nessas diligências de hotéis em Unaí (MG), explicou que, chegaram até Chico Pinheiro da cidade de Formosa (GO). “Em um dos hotéis, observamos uma situação suspeita, porque uma folha de registro havia sido arrancada, no período próximo à Chacina. No entanto, na página seguinte haviam deixado o número do documento que nos levou ao nome de Allan Costa Rios que já tinha praticado vários crimes”.


Durante a apuração, declarou também que as investigações levaram à suspeita de Hugo Pimenta, que não tinha fazenda e não havia sido fiscalizado, nem tinha relação com os fiscais. “Descobrimos que ele tinha ligação com Norberto Mânica”.


No interim, descobriram o Humberto, que parecia ligado ao crime. “No processo encontramos o Ronnei, que falou do Erinaldo, e quando descobrimos a ligação deles, fomos atrás do Chico Pinheiro e dos outros envolvidos. Todos foram presos”.


Durante o depoimento, Antônio Celso disse que Erinaldo confessou que havia jogado o relógio dentro de uma fossa. “A confissão está gravada em áudio e vídeo e registrado no processo. Zezinho e o Hugo Pimenta sempre negaram participação”.


Antônio Celso lembrou de alguns depoimentos, dentre eles, a ligação para o Ministério do Trabalho perguntando sobre os fiscais, se eles estavam vivos ou mortos. Descreveu vários outros pontos da investigação.


O policial aposentado, ao descrever a investigação, foi questionado pela juíza sobre a participação do Antério Mânica e disse “As minhas investigações não me levaram ao Antério Mânica”.


A juíza perguntou para quem as investigações apontaram como mandante, e Celso respondeu que “ao Norberto Mânica”.

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